Terapia com Michael Scarn

 Cá estou eu, sentado de forma desconfortável de frente para uma terapeuta, só posso tentar esconder o nervosismo dessa nova experiência. Talvez minha tentativa de disfarce não tenha sido muito convincente, já que a Dr.a Michael Scarn sugeriu que fôssemos para outro lugar: a famosa cantareira.

Sim, eu sou mais um carioca tradicional, daqueles que desceu do morro para vencer essa corrida contra um sistema que me freia, talvez as dificuldades do crescimento tenham me trago até essa mesa de bar. Nem mesmo o traje despojado (camisa do Flamengo, bermuda e sandália) podem me tranquilizar perante aos olhos clínicos dela. Além do mais, eu sempre enfartei de vergonha na frente das mulheres, em especial as de olhos grandes e intelecto encantadoramente admirável. Eu espero que por fora eu pareça relaxado e sem preocupações, já que o perfume que usei em excesso faz meu nariz coçar de forma incômoda. Minha altura nem sempre ajuda, por mais que eu estufe o peito para mostrar que os treinos estão em dia, o mais notável são que minhas pernas não cabem em lugar algum. Desengonçado!

À primeira vista, talvez eu possa parecer alguém em constante movimento, traçando um caminho linear até os objetivos, mas na realidade eu me sinto preso aos momentos que já se foram. Crescer não é fácil, ao invés de pagar contas e comprar a comida, eu gostaria de voltar a assistir novelas no sofá com meus pais, protegido pela segurança que o lar trazia. Eu sentia que meu olhar recuava por saudades do meu antigo relacionamento, mas percebi que na verdade minha saudade é em relação à época que calhou de ser a mesma desse namoro passado. Eu sou daqueles caras detalhistas, que enfeita pensamentos que poderiam ter mais simplicidade, isso pode ser bem ruim às vezes. O nervosismo toma conta de mim nesse momento, eu não deveria estar me tratando com uma terapeuta da minha idade! Como dito, estou morrendo de vergonha nesse momento, fica claro com tantos gaguejos a cada frase que digo. Eu não gosto quando me encaram, mas tem sido o trabalho dela nos últimos 20 minutos em que estamos aqui. De alguma forma mágica (ou científica) ela me descreveu com extrema precisão, mlk essa mina é foda!

Eu sou composto por sentimentos, são tantos que preciso vomitá-los em algum momento. Eu nunca estive nessa posição, não sei se faz parte da terapia mas sempre que tenho coragem de encará-la de volta, sinto ternura no seu olhar. Após ser engolido por aqueles olhos (lindos olhos escuros) por mais de 30 minutos, agradeço ao garçom com um singelo ‘’valeu meu patrão, tu é brabo’’, e vamos embora.

Eu não sei o que esperar da terapia, mas eu vejo na Scarn uma boa vontade em me ajudar nesse momento, fico feliz e esperançoso por isso.

                                                                    

                                                                                                            Virgilio Expósito