Uma análise de Virgilio Expósito

 Sempre limitei minha relação com os pacientes ao consultório, mas com Virgílio sabia que não ia rolar, já que coçava a cabeça e franzia a testa a cada dois minutos. Precisei sair das quatro paredes que o sufocavam e começamos nossa terapia no melhor lugar possível: na cadeira da mesa amarela do bar da esquina. 

Virgilio Expósito é um carioca nato, cheio de gírias e com um sotaque daqueles que a galera dos outros estados imita, aquele chiado típico. Cabeça raspada e meio descolorida do carnaval. Inclusive, sente saudade dele. Chegou com camisa de time, bermuda meio amarrotada e aquela Havaiana branca de lei. Talvez essa imagem externa que ele construiu fosse uma maneira de afastar cada vez mais a percepção das pessoas da pessoa ansiosa e detalhista que vivia dentro dele, já que ficava cabisbaixo e não fazia muito contato visual ao falar sobre coisas profundas. Queria parecer relaxado e despreocupado sempre. Por fora um cheiro de perfume bom que exala pelo ar quando ele passa, aquele perfume que quem sente odor parecido depois lembra dele. Meio seco, mas forte. Sempre forte. Virgílio sabia que sua altura e porte físico chamavam atenção e usava de outros artifícios para aparecer mais. Usava e abusava dos sentidos das pessoas. 

À primeira vista, Virgílio pode parecer desapegado e engajado com o futuro, mas é um daqueles saudosistas, que olha para o passado com mais vontade de voltar para ele do que para o futuro que lhe aguarda. Ainda não superou seu antigo relacionamento e sofre velado. Chora de vez em quando, sente falta dela e talvez essa seja a maneira que seu cérebro encontrou para decodificar uma ausência primária de sua família, já que passara por problemas e incertezas com ela. Ele achava que esse relacionamento iria durar para sempre, mas é por ele que estamos aqui, comendo mais uma porção de batata frita. Expósito gosta de detalhes. É daqueles super detalhistas, que param o tempo para admirar faíscas dele. Cada detalhe importa: cheiro, toque, temperatura, pele, roupa, trejeitos. Talvez toda essa perfeição fosse seu objetivo de vida, mas sua ansiedade o consome. Por fora, Virgilio Expósito parece um cara super seguro, autoconfiante, mas consigo perceber suas fraquezas. É daquele tipo de ansioso que não consegue respirar para formar frases, sai embolando palavras. Sabe aquele tipo de respiração no peito, meio ofegante sempre? Essa é uma marca registrada dele. Só relaxa quando está viajando em seu universo particular: sua memória. É uma forma de escape que funcionou por muito tempo para acalmá-lo, mas hoje ele recorreu à mim. 

Mas de tudo o que é, seus afetos são o que o tornam ele. De toda essa forma ansiosa por dentro e seguro por fora, Virgílio transparece amor, carinho e alegria para as pessoas. Um “Fala, parceiro” para o garçom, dois beijos no rosto para me cumprimentar. Talvez por isso seja um cara de muitos amigos, como ele mesmo mencionou hoje. 

Sei que temos muito trabalho pela frente e fico muito feliz em saber que posso guiá-lo nesse caminho longo e difícil chamado autoconhecimento.

                                                                                                    Michael Scarn