Fim de festa. Música já baixa. Olhos de ressaca pedindo para fechar. Copos plásticos espalhados pelo salão. Uma vassoura sendo arrastada no piso já pegajoso ao andar. Questionamentos abstratos pairam no ar da madrugada junto com o hálito etílico dos amigos ali reunidos.
Formiga, sempre inconformado com o mundo, encarou-me com seus escuros olhos, pequenos em tamanho, mas grandes em intensidade:
-Glen, eu vou pro inferno.
Levantei, de supetão, o olhar focado num papel de bala que rodopiava no chão. Questionei a sobriedade do garoto que, com sua magreza, mal sustentava o peso do próprio corpo.
-Eu tô bem, pô! Faço até o 4 tranquilo. Inclusive é isso que eu tava pensando aqui, eu aceitei que vou pro inferno e isso deixa a minha consciência limpa, tranquila. Sem preocupação, sem estresse, vivendo o que eu tenho que viver. - Vociferou, puxando do bolso um maço quase vazio de Kant de melão.
Puxei seu isqueiro com escudo do Fluminense do centro da mesa antes que ele pudesse alcançá-lo, e aleguei que ele não viveria muito do que tinha pra viver se continuasse fumando daquela forma.
Ao invés de tentar puxar o acendedor de minhas mãos, como era esperado, levantou-se e caminhou, quase tropeçando nos cadarço desamarrados, até a sacada. Ele fitou o horizonte e tamborilou os dedos no pacote amassado de cigarro enquanto o vento do alvorecer bagunçava seus fartos cachos.
- Como eu vou pro inferno se não há Deus? O que é Deus? O que significa a palavra Deus além de Deus por si só?
Quase dava pra ver as engrenagens girando em velocidade atômica na sua, sempre sagaz, mente enquanto as indagações mais variadas sobre o “Criador” pipocavam de sua boca. Minha própria cabeça estava ficando atordoada e falei que, infelizmente, não tinha nenhuma resposta para suas dúvidas, uma vez que elas também eram razão das minhas inquietações.
-Tudo bem, Glen. Meu próprio nome já diz, eu sou só uma Formiga…- Ele disse ao, afetuosamente, colocar as mãos calejadas sobre meus ombros antes de sair.
Mal sabia ele que, comparado com muitos do formigueiro, ele era brilhante e único.
Glen Coco
muito legal sua crônica, criativa e rica em detalhes, como um perfil tem que ser, parabéns!
ResponderExcluirHahahahahaha que pena que eu sou tricolor na sua visão. Mas gostei do final, me senti ofendido a crônica inteira, mas você acertou em muita coisa e o final foi maravilhoso. Excelente crônica. Um beijo da formiga!!
ResponderExcluirFico feliz que gostou! Infelizmente errei o time de três cores que você torce, a gente escreve pensando no melhor de cada um mas não dá pra acertar sempre kkkkkkk
ExcluirGostei de como inseriu o diálogo em um momento fictício, bem narrado.
ResponderExcluirGostei, cumpriu o propósito! Mas confesso que gostei mais do início que do fim. "Quase dava pra ver as engrenagens girando em velocidade atômica na sua, sempre sagaz, mente" esse trecho eu escreveria de outra forma. Não compreendi na 1° que li e tive que acabar relendo.
ResponderExcluirSó porque você escreveria de uma forma diferente não significa que não é compreensível, né? Mas tudo certo.
ExcluirGostei bastante da crônica, as falas entraram em momentos bons e a descrição do personagem também foi boa.
ResponderExcluirÓtima narração, a mistura dos diálogos com os detalhes do personagem funcionou bem. Parabéns!
ResponderExcluirGostei muito da narração e do diálogo, consegui visualizar bem a cena e o personagens, parabéns!
ResponderExcluirNarração e diálogos incríveis! adorei o jeito que você abordou o tema num formato fora da caixinha, trazendo essas questões existenciais humanas pro diálogo, que por sinal, foi muito bem escrito. Parabéns!
ResponderExcluirMe senti conduzido na leitura, você encontrou uma forma incrível de explorar a proposta, muito bom!
ResponderExcluirUau, que textão bom!! As descrições da personagem foram se encaixando perfeitamente nessa história incrível que você construiu e que nos falou muito, talvez até mais do que falaria se fosse só uma descrição direta. Muito bom e leve de ler, instigante do título ao fim. Parabéns!!
ResponderExcluirNossa, que crônica ótima! Eu gostei demais de como você construiu ela! Parabéns!
ResponderExcluirAdorei a crônica. Achei triste hahaha mas curti bastante.
ResponderExcluirConseguiu fazer uma história bem intensa, as descrições se encaixaram muito bem. Parabéns!
ResponderExcluirNossa, muito boa! Consegui imaginar o ambiente a partir das suas descrições, e foi um jeito criativo de descrever o personagem.
ResponderExcluirGostei bastante da crônica, a narrativa de diálogo sempre me encanta muito.
ResponderExcluirApenas atentaria para "nos cadarços* desamarrados", e talvez eu invertesse a ordem da sentença "Quase dava pra ver as engrenagens girando em velocidade atômica na sua mente*, sempre sagaz", mas apenas por eu ter dificuldade mesmo com essas sequências, nada contra o formato.
As escolhas foram felizes e a narrativa de o toque especial da crônica.
Parabéns
Conseguiu equilibrar perfeitamente os diálogos e as descrições. O texto ficou muito rico e gostoso de ler, parabéns!
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