É como naquela música de Clarice. Eu digo que era manhã. Ele: “Três da
tarde”. Acontece que em nossa versão seria o amanhecer de um sábado
ensolarado, ou um domingo friorento que a gente acorda depois das 11h.
Lembro que fui pega de surpresa. Já o papai, diz que conversamos a semana
inteira sobre a “despedida”.
Era um dia importante. Meu pai conta que acordei empoderada, exalando ar de
superioridade, como uma mocinha crescida. E eu? Humildemente acho que só
coçava os olhos inchados cheios de sono.
De flash em flash, o que me recordo mesmo é ouvi-lo dizer: “Pronta, filhota?
Vamos nessa!” com um sorriso genuíno e orgulhoso estampado no rosto.
Papai fala que ainda estávamos de pijama. Discordo plenamente. Vestia uma
saia amarela de babado, já que depois partiríamos para um almoço na vovó.
Rememoro, sem dúvidas, que ele me levantou e colocou na “carcunda do
gigante”. Na lembrança - errônea, diga-se de passagem - dele, fomos
caminhando de mãos dadas até a lixeira na cozinha.
Aqui, não restam quaisquer divergências: Afirmamos que a lata de lixo foi
aberta como um portal para a vida de gente grande. Encarei assustada a feição
sorridente do papai. Apertei sua mão, que era o dobro da minha, e senti o
medo dissipar rápido e abandonado. Para garantir, a voz que sempre me
acalma soou despreocupada: “Tô aqui, zé mané. Pra sempre.”
Com as mãozinhas miúdas, tapei os olhos e joguei. Não tinha volta. Lá no
fundo, escutei um “aêêê!” da mamãe. Meu pai me pegou no colo, girou, girou,
girou e gritamos juntos na janela:
- Adeus, chupeta!
Bic Cristal
Bic, adoreeeei seu texto! kkkkkk desde o início, imaginei que fosse a despedida do seu pai, mas o final me pegou de surpresa, ri alto aqui. Amei a forma como abordou a sua memória, você realmente tem talento para escrita! Meus parabéns!!!
ResponderExcluirQue bom que gostou, Lua! Fico honrada! Obrigada!
ExcluirConcordo com a Lua, Bic, fiquei com um sorriso no rosto no final. Estava meio aflito lendo, não sabendo o que seria e tal, porque estava muito bem escrito haha. Mas uma perguntinha de curiosidade: você tinha quantos anos? Abraços!!
ResponderExcluirAsa, isso também nunca entramos em um consenso! Eu e minha mãe juramos que eu tinha 4, mas meu pai diz que eu tinha 3... Hahaha
ExcluirBic, confesso que também fiquei meio assustado com o texto, mas o plot-twist dele foi genial, realmente, você me fez dar um grande sorriso. Parabéns pela escrita!!!
ResponderExcluirMuito obrigada, Melo. Fico feliz que gostou.
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