quinta-feira, 22 de julho de 2021

Quando dei significado a um nome

Fomos até a casa do moço alguns muitos anos mais velho que meu pai que se chamava

Norberto. Seu nome e sua aparência eram toques muito sutis da vida, como se ele

realmente tivesse nascido e crescido para se tornar o que ele era há treze anos: cuidador

de gatos. Lembro-me da sua feição calma e até um pouco triste, seu cabelo era grande e

preto, com alguns fios grisalhos, mas que não atrapalhavam o contraste com sua pele

extremamente branca. Não sei como é a voz, a altura ou maneiras, mas lembro da sua

casa ser grande e aberta, cheia de gatos.

Na manhã desse dia, lembro de ter acordado cedo e ter sido convidada a sentar a mesa

com meus pais. Devia ser domingo, ninguém estava trabalhando e eu não iria para a

escola mais tarde. Eles me disseram que decidiram me dar um animal de estimação,

porém não seria um cachorro, nosso apartamento é pequeno e não podemos incomodar

os vizinhos. Sei disso pois ainda moro no mesmo lugar e ainda me sento a mesma mesa.

Fizemos o combinado de que eu cuidaria dele sempre e o daria muito carinho. Acho que

não há tarefa mais fácil para uma criança de cinco anos que nunca teve um bichinho

além de peixes dourados da pescaria das barraquinhas de Santo Antônio.

Não sei como chegamos àquela casa, só sei que eu me sentia no paraíso. Provavelmente

meus olhinhos, um pouco grandes, caídos e incrivelmente pretos, estavam brilhando

mais que o sol. Dentre todos os animais que vi, só me lembro de dois: um laranja e um

preto. Minha mãe repetiu inúmeras vezes e me recordo disso, pois foi por mais de treze

anos: o filhote todo preto parecia uma coruja. Ou um macaco. Ou os dois.

Lembro de me sentar no colo do meu pai e pesquisarmos naquele computador cinza de

tubo “nomes para gatos” e lemos várias listas. Eu ria, ria e me imaginava chamando

cada um deles. Escolhemos o mais especial, mas que não tinha nenhum significado.

No dia seguinte, voltamos na casa daquele homem e voltamos para a minha casa com o

meu filhote pretinho e que, a partir daquele momento em vida, porém desde sempre em

espírito, se tornou meu melhor amigo.

Clichê, eu sei. Não posso evitar, são memórias de uma criança que recém descobriu o

que é amar incondicionalmente um ser que não a oferece nada além do mesmo.

Fantasias ou memórias embaralhadas que se confundem com a realidade, sei que me

recordo do Norberto, porque ainda o vejo atravessando a rua às vezes e ele continua o

mesmo. Sei que me recordo do dia que conheci o meu bichinho, porque o amor é um

sentimento e sentimentos não são esquecidos e ele continua o mesmo. Tem uma música


do meu cantor favorito que diz “remember love if you can’t remember me”. Sei que eu

sempre lembro de ambos, ***** e amor agora são sinônimos.


Ametista

5 comentários:

  1. Esses amigos de patas são sempre marcantes na infância. To adorando essas crônicas, tudo me faz lembrar um pouquinho do que vivi. Ok, querida. Aproveite as memórias ♥

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  2. Ametista, que lindo! Como é especial esse amor puro, que não precisamos fazer nenhum esforço para amar e ser amadas. Só fiquei curiosa pra saber nome. Rs

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  3. Aaaaaa, amei! Achei tão fofo, pareceu até um trecho de filme do estúdio Ghibli! Eu sempre tive gatos, desde que me entendo por gente, mas quando era criança eu tive gatos pretos com o mesmo nome: Mimi.

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  4. Ametista, que meigo, os animais são seres tão incríveis, nos amam incondicionalmente, sem esforço, são fieis. Fico feliz que você pode disfrutar disso na infância, é muito especial ter um amigo de patas, digo por experiência própria, meu cachorro foi meu primeiro amigo...amei sua crônica

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  5. Aiii que fofinho ametista, amei sua memória <3

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