Quando pirralha, implorei para minha mãe permitir que eu criasse um Orkut. Eu
sei que foi precoce e, honestamente, eu não conhecia ninguém da minha idade que eu
poderia adicionar. Acabei vencendo pelo cansaço e fui orientada a não fazer amizade
nem conversar com nenhum estranho, além de ter que contar a senha para que minha
mãe pudesse me supervisionar.
Fiquei maravilhada com os jogos, as comunidades e os depoimentos. Mandei
indiretas no buddy poke, roubei a colheita alheia e participava da “Eu odeio acordar
cedo.” Foi uma esclarecedora experiencia millenial no meio da minha vida de geração z.
Pequena, eu entrei em uma colônia de férias para acompanhar meu primo mais
novo. Eu era a criança mais velha e não precisava usar o uniforme verde bebê que as
outras eram obrigadas. Lembro da primeira vez que eu escutei que eu era “muito
interessante” e que eu “não parecia com as meninas da minha idade”. Me senti
lisonjeada. Ninguém nunca tinha me falado isso antes. Assim, quando ele me mandou
uma solicitação no Orkut eu aceitei, afinal, ele não era um estranho.
Minha mãe usou seu poder de intervenção no meu Orkut duas vezes. A primeira,
quando eu entrei na comunidade “bonzinho só se fode”, sem saber o que era se foder,
porque eu achei a capa do bebê dando língua engraçada. Na segunda, para me perguntar
quem era o homem de 23 anos que tinha feito amizade comigo e o que ele estava
fazendo no Orkut de uma menina de 8.
A foto de perfil dele era apenas um olho e, quando eu a vi pela segunda vez, dez
anos depois me seguindo no Instagram, senti um arrepio. Na hora, lembrei desses
diálogos então recalcados pela minha mente.
Compartilhei com a minha psicóloga o interesse de saber quem era aquele
homem, sobre o que a gente conversava, como a gente chegou no ponto de se adicionar
na internet e, porque, dez anos depois ele me procurou, o que significava que ele, por
algum motivo, lembrava de mim.
Eu pensava que o pior que alguém poderia ouvir de um psicólogo eram as
palavras “vou precisar te internar”, mas, depois de ouvir a resposta que ela me deu, vi
que estava errada. “Sara , às vezes as coisas são esquecidas por um bom motivo.
Vamos confiar no seu cérebro dessa vez.”
Sara Maga
Caramba, Sara. Senti daqui o arrepio. Mal sei o que dizer, mas saiba que os braços estão estendidos, caso precise. Estamos juntas.
ResponderExcluirForte...pra mim é quase impossível não me identificar...mas como Bic disse, estamos juntas.
ResponderExcluirTambém fiquei todo arrepiado aqui. É muito, muito nojento pensar na situação. Eu não sei mais o que comentar... o conteúdo é realmente muito forte.
ResponderExcluirSara, impactante sua lembrança, fico triste por termos que passar por situações assim, e presto minha solidariedade caso um dia queira conversar comigo.
ResponderExcluirNossa Sara, que situação horrível! Consegui me envolver muito nas suas memórias e sentir o mesmo desconforto que você sentiu diante de tudo isso que você relatou. Estou aqui se quiser conversar comigo, abraço!
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